Miguel Arroyo: “A escola tem que se integrar com uma pluralidade de forças para dar conta da educação integral”
Sociólogo, educador e professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Miguel Arroyo é um dos especialistas mais requisitados quando o tema é educação integral – e, inclusive, esteve presente mês passado no debate que marcou o lançamento da 11ª edição do Prêmio Itaú-Unicef, cujo tema é “Educação integral: aprendizagem que transforma”.
Visando a aprofundar o debate e a própria concepção sobre educação integral, seus atores e desafios, o professor concedeu a seguinte entrevista à plataforma Educação&Participação. Confira.
Educação&Participação: O conceito de educação integral possui mais de uma definição, que pode variar de acordo com o especialista consultado. O Programa Mais Educação e a própria meta 6 do Plano Nacional de Educação (PNE), por exemplo, enfocam a educação integral a partir da ampliação da jornada. Gostaria de saber qual conceito você defende.
Miguel Arroyo: Bom, quando fui secretário adjunto de Educação (1993-1996) em Belo Horizonte (MG), o nome que demos à proposta pedagógica foi Escola Plural. Nesse sentido, plural, integral, total.
Por quê? Porque a concepção que eu tenho e defendo é a de que a própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) defende: a função da educação é garantir o pleno desenvolvimento humano dos educandos.
Essa é a concepção mais radical, que inclusive vem já de Paulo Freire, que falava: a função da educação é humanizar, é tornar o ser humano mais humano – e ele acrescentava: quando tantos seres humanos são negados em sua humanidade, são roubados de sua humanidade, a função da educação é recuperar a humanidade roubada.
Não nascemos prontos: nós nos tornamos humanos. Em que pode colaborar a escola nesse “tornar-nos humanos”, nesse tornar a criança, o adolescente, o jovem… humano? Pensando sobretudo no que Paulo Freire chamava de infâncias roubadas em sua humanidade, o que pode ser feito pelas ONGs, pelas escolas, por todos nós, para recuperar a humanidade que lhes foi roubada, para torná-los mais humanos?
Este, ao meu ver, é o sentido mais profundo da educação integral. Porque, na verdade, não é a educação que é integral: a formação humana é que é integral. Este é o sentido que eu defendo: o sentido de que a escola tem que se preocupar com a formação plena dos educandos, sobretudo aquelas infâncias e adolescências que a sociedade trata de maneira tão injusta, tão dura, tão cruel, aqueles a quem se nega a sua possibilidade de ser criança, de ser adolescente, que são jogados na pobreza extrema, que trabalham para ir à escola e vão da escola para o trabalho, que moram em lugares precaríssimos. É possível garantir humanidade plena nessas vidas tão precarizadas?
“A escola tem que se preocupar com a formação plena dos educandos, sobretudo aquelas infâncias e adolescências que a sociedade trata de maneira tão injusta, tão dura, tão cruel, aqueles a quem se nega a sua possibilidade de ser criança, de ser adolescente.”
E&P: Então, na verdade, o conceito da Escola Plural com o qual você trabalhou em Minas Gerais e o de educação integral se compatibilizam. Eles essencialmente são a mesma coisa?
Miguel Arroyo: Sim, penso que são a mesma coisa. Nós não demos o nome de educação integral, escola integral, porque isso veio mais tarde.
Aliás, o próprio Programa Mais Educação não queria apenas mais tempo na escola, mas que toda criança na escola fosse tratada como gente, respeitada em sua integralidade e trabalhada em sua integralidade.
A expressão “Mais Educação” confrontava-se com uma escola que não educa, que apenas ensina. O termo “Mais Educação” é para se contrapor à ideia de uma escola só para ler e escrever na idade certa – e está bom. Não. As crianças populares têm direito à educação plena, a “mais”. Tem que ser “mais”.
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