Disgrafia: letra feia pode ser sinal de mais problemas
Uma criança que tem letra feia e que já foi treinada por muito tempo a superar esta dificuldade sem grande sucesso ou que permanece com os mesmos garranchos e erros ortográficos pode não somente apresentar problemas motores ou espaciais de escrita, mas também outras condições que costumam se associar a isto. Nestes casos, é salutar investigar outras possibilidades que podem, neurologicamente e funcionalmente, influenciar negativamente no desenvolvimento e performance de escrita.
Para o ato de escrever, é necessário desenvolver requisitos funcionais e habilidades que permitam direcionar toda a percepção e energia para dar ritmo, persistência e controle inibitório às mãos para que esta redija adequadamente. Para isto, é importante a atenção seletiva e sustentada, a integridade da linguagem fonoarticulatória, lexical e semântico-pragmática, boa memorização operacional, coordenação visuo-motora preservada e capacidade de decodificação fonêmico-grafêmica. Tudo isto deve estar sendo operacionalizado e organizado por um bom funcionamento do sistema executivo e “regado a pitadas” de motivação e prazer. Fácil? Não! Complexo e repleto de detalhes? Sim, mas bem mais palatável e melhor administrado quando passamos a conhecer os mecanismos neurológicos e neuropsicológicos existentes na base do processamento da escrita.
A avaliação sistemática e interdisciplinar dos problemas de escrita é um dos passos mais importantes para se entender os reais motivos da persistência desta disfunção. Pode ser falta de estímulo ou de treino? Pode ser por utilização de método didático inadequado? Sim e sim. Mas é possível que esta criança tenha problemas de coordenação visuo-motora, a qual impede que a mesma venha a representar a escrita da mesma forma que percebe e vê as palavras num descompasso que resultará em garranchos, sobreposições de letras e alteração da escrita linear que respeite linhas ou limites.
Pode ser que ela tenha um Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) a qual, mesmo sem Hiperatividade, pode levar a problemas de atenção e falta de persistência motora, resultando em escrita com pouca atenção aos detalhes, perda de letras, “encavalamento” de palavras, disortografia, frases incompletas, alterações na disposição espacial das palavras, texto com pouco sentido além de cansaço e dor durante o ato de escrever. Se tiver uma hiperatividade associada, tais problemas ficam ainda mais evidentes e intensos. Crianças com TEA-Autismo, não persistem até o fim e costumam ter problemas sérios ao pegar no lápis com efeitos significativos na coordenação motora para escrever, pois ora não possuem boa propriocepção na “pega”, ora não conseguem coordenar a sequência da escrita.
A dislexia e os Transtornos Específicos de Linguagem (TEL) podem, com muita frequência, levar a problemas de escrita por refletir suas disfunções também no ato escrito. Os problema motores, de linguagem e de memória sequencial criam grandes obstáculos na persistência da atividade de escrever sem contar as trocas fonéticas e grafêmicas constantes. No tocante aos Transtornos do Desenvolvimento da Coordenação (TDC), as dificuldades de coordenação motora podem levar a caligrafia ainda pior com efeitos na organização, no esboço, no traçado e na postura adequada para a escrita.
Nem é preciso dizer, portanto, que estas condições abalam a motivação e geram grande desprazer para escrever reduzindo, aos poucos, toda a disposição da criança para este tipo de atividade. O professor, contudo, deve estar atento para estas situações encaminhando-a para uma avaliação e recuperando sua autoestima com atividades secundárias ou facilitando os registros por meio de outros caminhos.
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